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Tropeirismo, Patrimônio da Humanidade

Tropeirismo, Patrimônio da Humanidade

“O romantismo rendeu versos ao gaudério, e a história decantou o bandeirante, mas foram eles, os birivas que fizeram a integração desses povoados tão distantes”

Nilo Bairros de Brum

Quando percorremos o trajeto entre as cidades de Lages, no Planalto Catarinense, até Florianópolis,  a capital – antiga Desterro -, podemos observar a variação topográfica que a região apresenta, bem como a diversidade da fauna e da flora pelo percurso. Em tempos passados, esse trajeto foi desenhado e percorrido, pioneiramente pelos valentes desbravadores, que foram denominados de tropeiros. Epistemologicamente falando: a palavra “tropa” significa a reunião de um número de animais de monta ou transporte, eqüinos, muares e asininos, tocados pelos “Troperos”, termo espanhol que passou a ser “Tropeiros” em português. Mais tarde caracterizou também o movimento de tropas de bois, ovelhas, carneiros, porcos e perus, na ideia de rebanho em marcha para as feiras de comércio ou matadouros e invernadas.

O Tropeirismo teve início no Brasil no início do século XVIII e se prolongou até o século XX, mais precisamente até a década de 60, quando o tropeiro foi aos poucos substituído pelo caminhoneiro. No início, o ciclo do muar consolidou o ciclo do ouro e o aparecimento de uma nova camada social com as profissões de ferreiro, seleiro, funileiro, domador, latoeiro, trançador, bruaqueiro e outras mais. A transformação sócio-cultural foi intensa e os pequenos pontos de comércio e as pousadas fizeram surgir várias cidades, exatamente a um dia de cavalgada uma da outra.

Essa informação nos é preciosa, ao analisarmos mais especificamente a origem e a formação da nossa cidade: os tropeiros foram importantes no desenvolvimento da região e se recorrermos à História, veremos que famílias tradicionais daqui tiveram nos seus antecessores um ferreiro, um seleiro, um funileiro, um domador, etc. São profissões ainda vívidas e vivenciadas em Rancho Queimado, passadas de geração em geração.

A própria origem da cidade, que naquela época tinha um comércio ativo e consolidado – em especial o Distrito de Taquaras – configura no cenário da historiografia catarinense, como escreve LUZ (1999) no livro Os Fanáticos (p.105): “em 1901 a estrada que partia de Florianópolis só chegava até Taquaras; daí para diante só se podia viajar a cavalo”. Tínhamos aqui, hospedarias, invernadas de pouso para os tropeiros  e um latente comércio que ligava o povo do planalto ao povo do litoral.

É interessante observar que a distância entre as atuais cidades justificam essa observação, que os povoados se formavam a um dia de cavalgada, um do outro. Excetuando a área metropolitana da capital, que já apresenta a chamada conurbação, o restante dos municípios ainda se encontram distantes entre si. O que os deixou mais próximos foi o progresso: estradas e veículos, no lugar das antigas tropas.

O comércio de animais foi fator determinante para integrar efetivamente o sul ao restante do Brasil, apesar das diferenças culturais entre as regiões da colônia, os interesses mercantis foram responsáveis por essa fusão e indiretamente, pela prosperidade tanto da grande propriedade estancieira dos estados do sul, como de pequenas propriedades familiares, em regiões onde predominaram populações de origem européia e que abasteciam de alimentos as fazendas pecuaristas.

Assim surge também a localidade de Taquaras – última linha colonial da Colônia Alemã de Santa Isabel – miscigenando o imigrante europeu ao caboclo viajante. Juntos, enfrentaram as adversidades da região e confrontaram-se com os nativos, os bugres que aqui já viviam bem antes dessas outras etnias. Surge aí, uma comunidade autônoma, independente, e que configura no cenário histórico catarinense como um grande marco: Taquaras foi morada oficial do governador do Estado de 1911 até o final daquela década, exercendo papel, às vezes, de sede-provisória do governo, conforme evidenciam os documentos da época, que noticiavam a vinda do governador Hercílio Pedro da Luz e dos seus correligionários – que da sua fazenda, em Taquaras, administravam Santa Catarina por vários dias, até o retorno deles a Desterro.

O próprio nome que hoje o município carrega – Rancho Queimado – tem origem com as idas e vindas das tropas que percorriam os antigos “Caminhos das Tropas” e que por aqui tiveram um rancho de pouso, que por descuido dalgum tropeiro queimou e assim ficara referenciada esta região: “o local do rancho queimado”. Juntam-se a isso as experiências e trocas trazidas e levadas dos tropeiros viajantes por todos os povoados aonde percorriam, mais as lendas e estórias que se ouviam (e se ouvem até hoje) dos bugres daqueles tempos; temos muita História para esmiuçar e ter a partir daí muitas linhas de leitura e de pesquisas. Fica a dica para que outros se aventurem nessa invernada!

O tropeirismo ainda hoje está ligado ao modo de se viver das pessoas daqui, criando uma cultura diferenciada das demais, ao se confrontá-la e inseri-la na cultura germânica.  Em Santa Catarina, as homenagens a estes heróis viraram a lei de número 13.890, de 2006, que estabelece o dia 26 de abril, como o Dia do Tropeirismo. E em Rancho Queimado, a comunidade de Taquaras ergueu em homenagem a estes corajosos comerciantes, mensageiros e desbravadores o Monumento ao Tropeiro, que foi o primeiro monumento do país que valorizou a pujança desses, também aventureiros!

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fonte:
LUZ, Aujor Ávila da. Os Fanáticos. Crimes e aberrações da religiosidade dos nossos caboclos. Florianópolis: Imprensa Oficial, 1952.
SELL, Zélia Maria. Tropeirismo: patrimônio da humanidade. In: Revista História Santa Catarina. Ano VI, n. 38. Ed. Leão Baio, 2012. p. 73-83.
 
ilustrações: 
Getulio Delphim – disponíveis na Internet, em https://getuliodelphimeditorial.wordpress.com/
Jonei Bauer:

O texto acima é de inteira responsabilidade de Jonei Bauer, não expressando necessariamente a opinião do Portal do Rancho.

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